sábado, 6 de abril de 2013

Destino, liberdade e escolha





Vejo que muitas pessoas se questionam a respeito de liberdade, livre arbítrio e destino. Já participei de muitas conversas a respeito, mas acho que nenhuma delas foi muito longe, porque há muita incerteza a respeito disso, então é difícil se chegar a qualquer conclusão. Como eu gosto desse tipo de mistério, questionei isso a fundo, chegando ao que vou apresentar agora.

Existe crença e descrença no destino. É complicado pensar em destino quando pensamos que tudo na vida já está predeterminado e não tem como ser mudado. Assim fica difícil falar em livre arbítrio, ou que temos alguma liberdade, pois se temos um destino fixo, não temos nenhuma escolha. Vou tentar esclarecer tudo isto do meu ponto de vista, segundo o qual destino, liberdade e escolha realmente existem e exercem influência uns sobre os outros.

Segundo Alexander Lowen, destino tem a ver com caráter, e para isso devemos entender o que é caráter. È comum as pessoas falarem em “bom caráter”, “mau caráter” ou sem “caráter”. Em seu livro Medo da vida, Lowen descreve o caráter da seguinte maneira: (...) o caráter determina o destino. Caráter se refere ao modo típico, habitual, ou “característico” de ser e comportar-se de uma pessoa. O caráter define um conjunto de respostas fixas, boas ou más, que são independentes de processos mentais conscientes. Não podemos modificar nosso caráter por meio da ação consciente. Não está afeito às rédeas de nossa vontade. Em geral, não temos consciência de nosso caráter porque ele se tornou nossa “segunda natureza”.

O que essa descrição de caráter nos quer dizer é que temos uma forma padrão de responder às questões da vida que é inconsciente. É como eu disse em a constante mutação e os hábitos, estamos habituados a uma forma de ser e de encarar as coisas. Podemos dizer então que o nosso caráter, ou melhor, os nossos padrões, regem o nosso destino. Mas se podemos modificar o nosso caráter, então podemos também mudar o nosso destino, mas a única forma de se fazer isso é reconhecendo e aceitando os nossos padrões. É como quando apontamos uma característica negativa de alguém para que ela mude: ela só irá mudar se ela aceitar o que ela é, por exemplo, enquanto uma pessoa não aceitar que ela é egoísta ela continuará assim.

Mas se temos um padrão inconsciente de resposta, então significa que nem sempre temos liberdade de escolha, pois na verdade estamos submetidos ao que a mente está habituada, escolhendo, na verdade, o que a mente quer, e não o que nós queremos. Isso acontece por que no processo de desenvolvimento da consciência aprendemos com nossos erros. Aprendemos como agir de forma mais eficiente e também aprendemos a nos defender, e a autodefesa é determinante nas nossas chamadas “escolhas”. Nossos mecanismos psíquicos de defesa são formados pelos traumas, decepções, angústias e mágoas que adquirimos ao longo dos anos e que não fomos capazes de apagar. Assim adquirimos medos, fruto da negatividade proveniente dos sentimentos de dor que ficaram gravados na memória inconsciente.

Esses medos inconscientes tem grande poder de influência sobre nossas atitudes e modo de ser, pois como nos agarramos ao passado traumático, aos nossos sofrimentos, passamos a nos defender deles pelo resto da vida ou até que deixemos que eles se vão. Na verdade nos defendemos da mente, pois os medos são apenas uma imagem, uma ilusão que só existe dentro dela: é a mente defendendo-se contra si mesma. Seja como for, erramos e nos decepcionamos muito durante a vida, e por isso nos defendemos, pois sabemos que estamos sujeitos a sofrer com tudo o que temos e fazemos, de modo que inconscientemente acreditamos que a dor está para surgir a qualquer momento.

O apego ao passado nos tira a atenção do momento presente, fazendo com que acreditemos que o presente é doloroso como foi o passado, e assim criamos a ideia de que só seremos felizes no futuro, um futuro pelo qual sonhamos e esperamos mas que nunca chega, ou se chega não percebemos. Como disse Eckhart Tolle no livro O Poder do Agora, vivemos o presente com olhos do passado, ou seja, vivemos traumatizados, e é aí que a mente cria defesas contra o momento presente. Vou usar o casamento como exemplo, pois ele só dá certo com uma pessoa, e até que se encontre essa pessoa, muitos relacionamentos dão errado. Desse jeito a mente se habitua facilmente ao erro, e de acordo com o exemplo entramos em cada novo relacionamento com as defesas erguidas por medo de dar errado novamente, pois tendemos a pensar que haverá o mesmo sofrimento que houve nos relacionamentos anteriores.

Na vida nos deparamos inúmeras vezes com situações de incerteza em que temos que fazer escolhas, optar pelo que achamos que é certo e melhor a ser feito. Como estas situações nos pressionam, e como a mente também nos pressiona com o seu medo do erro, frequentemente optamos por aquilo ao que a mente está habituada: o erro. A mente nos controla através do medo que nela está impregnado, então não somos nós quem escolhe, e sim a mente, que dotada apenas de raciocínio lógico e desprovida da intuição, só sabe comparar as coisas com base na memória, e quando desconectada da fonte dessa intuição e da sabedoria que permitem o correto discernimento, age de forma inconsciente e mecânica. O inconsciente age mecanicamente porque é sua natureza, ele é programado para isso, e ele não discrimina o certo do errado, apenas reage às coisas independentemente disso, pois ele é programado para isso.

Então não fazemos escolhas. Como então mudar o destino? Vamos falar agora de livre arbítrio e liberdade. Entendo o livre arbítrio como algo diferente de liberdade. Sabemos que temos o livre arbítrio para vivermos como bem entendermos, mas isso significa que tenhamos liberdade? Não. Um criminoso na cadeia tem livre arbítrio, mas está desprovido de sua liberdade. Livre arbítrio, para mim, significa que estamos livres para escolher como vamos viver e liberdade significa estar livre de qualquer tipo de aprisionamento, inclusive mental. Neste sentido, estamos desprovidos de liberdade, pois não estamos livres da nossa consciência. E do mesmo modo, no nível de consciência comum estamos presos pela mente, sendo submetidos às suas escolhas, o que nos torna escravos de nossos padrões.

Portanto, liberdade para mim é estar livre da necessidade de fazer escolhas, mas isso só é possível atingindo um nível de consciência onde a escolha é realmente consciente. Um nível de consciência em que simplesmente percebemos o que é certo, o que é melhor a ser feito, em uma determinada situação sem que haja interferência da racionalidade da mente, mas por meio da intuição. Mas se soubéssemos o que é certo, o que é o melhor a se fazer, precisaríamos optar? Eu acredito que não haveria opção, simplesmente faríamos o que devesse ser feito, pois não haveria dúvidas. É onde estaríamos livres da escolha. Mas para se chegar a este ponto precisamos nos livrar das barreiras mentais que nos forçam a escolher o erro, ou seja, devemos nos desapegar do passado. Assim, não deve haver erro no que disse minha mestra: liberdade é se desvencilhar do apego.

FYM

Jerônimo Martins Marana




quinta-feira, 28 de março de 2013

Perdão e amor incondicional


Neste post eu quero falar sobre amor incondicional e perdão, mas voltando o tema para os casais, pois se eu falar desse tema com relação a pais e filhos ou com relação aos amigos acho que eu não teria nada de diferente para acrescentar, porque acredito que sobre isso todo o mundo já sabe. Creio que focando em casais eu posso englobar os amigos e a família por dois motivos: um deles é porque em primeiro lugar, duas pessoas que formam um casal devem, em primeiro lugar, ser o melhor amigo um do outro, não preciso nem falar o motivo. E depois, uma família geralmente é formada a partir de um casal, pois sem que haja um casal não há como haver pais e filhos (um filho adotivo, por exemplo, nasceu de um casal). Na verdade, esse texto, assim como os outros, é mais um desabafo, pois fico triste com a ausência do perdão e do amor incondicional e acabo me sentindo impelido a falar o que penso a respeito.


A princípio vou começar falando a respeito do amor dos pais, principalmente o da mãe, pelos filhos, com o fim de comparação. Uma mãe ama o seu filho incondicionalmente, independente de suas escolhas. Mesmo que o filho seja criminoso e esteja preso, o instinto materno é forte e ela fará tudo o que for possível para tê-lo de volta e para ajudá-lo a mudar. Se o filho for viciado em drogas, a mãe, os pais farão de tudo para que ele se livre do mal. Nunca irão julgá-lo, nunca deixarão de amá-lo e de ajudá-lo e estarão sempre esperando até o dia em que o filho volte para seus braços e para seu lar são e salvo.

Entre amigos também ocorre algo semelhante, pois quando surge algum problema entre eles, não tarda até que o resolvam se forem realmente amigos, mesmo que o problema os tenha afastado.


Agora eu me pergunto – e espero tê-lo levado a questionar o mesmo – por que não acontece o mesmo com relação ao amor “romântico”. Esse tipo de relacionamento é tão egoísta e possessivo que raramente existe amor incondicional nele. Muitos podem contra-argumentar, mas quando o casal está unido é fácil. Mas não é a isso que me refiro. Volto na questão tratada no post “A proibição do sentir”: O que impede uma pessoa de amar à outra quando o amor não é correspondido? Arrisco-me a dizer que é o medo. Do sofrimento, de nunca conquistar a pessoa amada. E também uma autoimagem tão egocêntrica, talvez até narcisista, que leva a um instinto (talvez melhor do que “instinto” seja a palavra “desejo”) de preservação porque o sujeito sente que a sua imagem frente aos outros é prejudicada se ele sofrer por alguém que não o corresponde e que, muitas vezes, o maltrata.

Decorrente desse medo surge ódio e aversão pelo outro, o que contradiz qualquer ideia de amor verdadeiro. Isso faz com que muitas pessoas pelo fato de terem passado pela mesma situação, incentivem o medo nos seus amigos quando eles gostam de alguém que não lhes retribui. Estas pessoas acreditam (se você já se acostumou com os meus textos já deve saber que me refiro a acreditar no nível inconsciente) que tem uma reputação e uma imagem a proteger.


Se uma pessoa ama a outra, só pode ser de forma incondicional, pois o amor é incondicional. Se não for então não é amor. O amor verdadeiro não exige troca, esse é o ideal de Platão (daí amor platônico) de amar sem exigir ser amado, amor desinteressado, altruísta. Mesmo que o outro não corresponda às expectativas de um, nada impede este de sentir o que está sentindo. As pessoas falam de uma suposta relação entre amor e ódio, mas aqui uso as palavras do mestre Eckhart Tolle: o amor não tem opositor, chamamos vulgarmente de amor aquilo que é o oposto de ódio.

Isso inclui e exige a capacidade de perdoar. Vamos imaginar, para usar como exemplo, que um casal se separou e um dos dois sai cada dia com uma pessoa diferente, faz um monte de atrocidades com o coração do outro e tudo o mais. Por que não se pode amar essa pessoa e ter a esperança de ela voltar um dia, assim como a mãe do filho viciado ou criminoso? Se um dia essa pessoa voltar arrependida, pedindo perdão e se mostrando diferente, ou ao menos tentando, ela tem o direito de ser perdoada. É claro que você não é obrigado a permanecer ao lado de um parceiro que vive te traindo, mas isso não o impede de amá-lo ou perdoá-lo. Se você se lembra do Novo Testamento, Jesus não julgou a prostituta.
 
Somente uma pessoa muito insensível e muito rancorosa não é capaz de perdoar. Mas o que a faz agir assim é o seu apego ao passado que faz com que ela acredite que tudo é eterno, que nada muda, e por fim, que a outra pessoa não muda. Por estar habituada com a antiga imagem do outro ela permanecerá rancorosa, magoada e desconfiada.

É preciso aprender a perdoar e amar incondicionalmente, pois amor verdadeiro é incondicional, e ser incondicional exige perdão. Com perdão o amor não é egoísta e possessivo e supera qualquer dificuldade. Não se pode ter medo de amar porque isso nos torna fechados, o que impede que a vida flua, pois viveremos sempre desconfiados do namorado, namorada, cônjuge, transformando o relacionamento numa disputa onde cada parte tenta estar sempre acima do outro e preservar sua autoimagem, seu ego, nunca cedendo em nada por receio de ser dominado e manipulado pelo outro. Além disso, pode-se chegar ao nível de buscar um relacionamento não com quem realmente amamos, mas com quem nos dá segurança e algum prazer, que um dia acaba. Aí está, para mim, o principal motivo do número absurdo de divórcios que vemos hoje em dia. É óbvio que precisamos de segurança dentro do relacionamento, mas só isso não basta, porque em primeiro lugar um relacionamento precisa de amor.


FYM

Jerônimo Martins Marana